Natal e Santa Cruz (RN) - A cada quatro horas uma brasileira é vítima de violência no Brasil. A campanha Agosto Lilás trata desse tema, sendo agosto o mês dedicado ao enfrentamento dos mais diversos tipos de violência contra a mulher. Para garantir o direito à assistência e ao acolhimento humanizado, hospitais universitários federais vinculados à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) oferecem atendimento e apoio a mulheres vítimas de violência sexual, de forma gratuita, via Sistema Único de Saúde (SUS), a exemplo do que acontece na Maternidade Escola Januário Cicco (MEJC) e no Hospital Universitário Ana Bezerra (HUAB), unidades hospitalares da Universidade Federal do Rio Grande do Norte vinculadas à Rede Ebserh.
A Maternidade Escola Januário Cicco (MEJC) atua desde 2001 por meio do Programa de Atenção à Mulher e Adolescente em Situação de Violência Sexual (Proama), como referência no cuidado especializado a esse público, ofertando atendimento multiprofissional com vistas à proteção da saúde das vítimas assim como dos seus direitos sociais. A instituição compõe a rede integrada de hospitais que propiciam atendimento com foco no cuidado integral, oferecendo atendimento inicial, em nível de urgência, e a continuidade desse cuidado no seguimento ambulatorial, garantindo ainda suporte por meio das áreas de Serviço Social e Psicologia da unidade hospitalar.
Ao longo desses anos em que desenvolve o atendimento às vítimas de violência sexual, a MEJC já atendeu 1.500 mulheres, adolescentes e crianças e realizou, nos últimos cinco anos, 60 abortos legais cujas gravidezes foram resultantes de estupros. Embora as crianças não sejam o público-alvo do programa, quando alguma avaliação especializada na área de ginecologia é solicitada por algum serviço de saúde ou quando o serviço é procurado por meio de demandas espontâneas, as crianças são acolhidas pela instituição e recebem o cuidado ofertado às vítimas de violência sexual, incluindo o seguimento ambulatorial com ênfase na infância.
O cuidado ofertado pela MEJC compreende as etapas de acolhimento humanizado; escuta qualificada; registro e sigilo das informações; atendimento clínico e psicossocial; profilaxias das infecções sexualmente transmissíveis - IST´s/AIDS; preenchimento da ficha de Notificação Compulsória de Violência Interpessoal/Autoprovocada – Sinan; realização de exames clínicos e complementares; contracepção de emergência e aborto legal, quando necessário.
Melissa Araújo, assistente social da maternidade, chama a atenção para a relevância das ações de acolhimento e atendimento dispensadas a usuárias vítimas de violência que recorrem à unidade hospitalar. “O trabalho desenvolvido de forma integrada pela MEJC possui um papel social de suma importância para a sociedade na medida em que sua atuação na política pública de saúde promove fatores de proteção à integridade física, psicológica e social de meninas e mulheres vítimas de violência sexual”, enfatiza.
Hospital da Rede Ebserh em Santa Cruz é referência para a região
Já no Hospital Universitário Ana Bezerra (HUAB), o Serviço de Atenção às Pessoas em Situação de Violência Sexual é definido como Amae e tem como público-alvo mulheres e crianças. O atendimento ocorre de forma emergencial, integral e multidisciplinar, sendo disponibilizado de forma ininterrupta, 24 horas por dia, nos sete dias da semana.
Além do pronto atendimento com acolhimento, escuta qualificada e atendimento humanizado, a atenção clínica é realizada por equipe multiprofissional, incluindo diagnóstico e tratamento de lesões físicas; amparo médico, psicológico e social; profilaxia de gravidez e infecções sexualmente transmissíveis - IST’s; além de informações às vítimas sobre direitos legais. O serviço assegura a oferta da continuidade do cuidado, incluindo realização de exames regulares, de acordo com os protocolos clínicos e diretrizes técnicas em vigor, e encaminhamento aos serviços de assistência social.
O Amae existe desde 2016, ano do credenciamento SUS da instituição, quando o HUAB se tornou referência no serviço para os municípios da V Região de Saúde do Rio Grande do Norte. Para acompanhamento do serviço na instituição, foi instituído em 2020 o grupo de trabalho de assistência às vítimas de violência sexual e da interrupção legal da gestação (GT-AMAE), composto por equipe multidisciplinar envolvendo profissionais de Psicologia, Serviço Social, Enfermagem, Ginecologia/Obstetrícia e Farmácia. Os dados do último triênio apresentam atendimento a 39 casos da região.
Superação de obstáculos
Para a enfermeira obstétrica Hercilla Confessor, um dos desafios envolvendo a iniciativa consiste na superação de obstáculos que limitam a vítima na procura pelo serviço de saúde. “Sendo as primeiras 72 horas após a violência sexual fundamentais para o atendimento”, adverte. “Quanto mais precoce a vítima chegar ao hospital, logo será cuidada”, diz.
A profissional chama a atenção, ainda, para a importância da formação profissional com perfil para atendimento a casos como esses. “Além disso, na instituição de ensino, as residências em saúde participam da assistência, sendo importante na formação de profissionais especialistas quanto ao desenvolvimento de habilidades e atitudes nesse perfil, de modo a preparar o futuro profissional para o atendimento mais qualificado e sensível”, complementa Hercilla.
Normativos legais
A Lei Maria da Penha (11.340/2006) cita cinco tipos de violência contra a mulher: física, psicológica, moral, patrimonial e sexual. No caso da violência sexual, o abuso ocorre quando uma pessoa é forçada a ter relações ou é submetida a qualquer tipo de ato sexual sem seu consentimento. A legislação normatiza e cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, estabelecendo medidas de assistência e proteção ao público feminino que sofre com esse tipo de abuso.
Em sessão realizada em 1º de agosto de 2023, por unanimidade, o Supremo Tribunal Federal (STF) entendeu que o uso da tese da legítima defesa da honra em crimes de feminicídio ou de agressão contraria os princípios constitucionais da dignidade humana, da proteção à vida e da igualdade de gênero.
Já a Lei Carolina Dieckmann, nº 12.737/2012, tornou crime a invasão de aparelhos eletrônicos para obtenção de dados particulares; e a Lei do Feminicídio, nº 13.104, de 9 de março de 2015, define o feminicídio como homicídio qualificado e aumenta a pena para quem o praticar (de 12 a 30 anos de reclusão). O feminicídio é o assassinato de uma mulher cometido por razões da condição do sexo feminino.
Canais de atendimento e apoio
Qualquer pessoa pode e deve denunciar indícios de violência contra a mulher. Para isso, existem canais como a Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180, serviço gratuito e em funcionamento durante 24 horas por dia, em todo o Brasil. O denunciante não precisa se identificar. A mulher recebe apoio e orientações sobre o que será feito para pôr fim à violência, com escuta e acolhida qualificadas. O serviço registra e encaminha a manifestação aos órgãos competentes.
Outra forma de solicitar ajuda é a página da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos (ONDH), por e-mail para o endereço eletrônico ligue180@mdh.gov.br, ou no aplicativo Direitos Humanos no Brasil. Também é possível acionar a Polícia Militar pelo 190, para que seja enviada uma viatura até o local da vítima.
Sobre a Rede Ebserh
Os Hospitais Universitários do Rio Grande do Norte fazem parte da Rede Ebserh desde 2013. Vinculada ao Ministério da Educação (MEC), a Ebserh foi criada em 2011 e, atualmente, administra 41 hospitais universitários federais, apoiando e impulsionando suas atividades por meio de uma gestão de excelência. Como hospitais vinculados a universidades federais, essas unidades têm características específicas: atendem pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) ao mesmo tempo que apoiam a formação de profissionais de saúde e o desenvolvimento de pesquisas e inovação.